Tive um ataque consumista na Amazon durante as últimas férias. Dentre os que vieram estava o livro do Messner, The Crystal Horizon, que fala sobre a escalada solo dele no Everest em 198o.
O livro é impressionante. Passa pelo início da idéia, durante a escalada frustada no Ama Dablan no ano anterior, onde ele ouviu a notícia de que o alpinista Naomi Uemura iria escalar o Everest solo no inverno no ano seguinte. Começa aí a história, detalhada ao extremo, da preparação, patrocínio, viagem pra o Nepal.
Uma vez lá, o Messner, junto com a companheira Nena Holgins, vai para o campo base chinês com um oficial de ligação e mais ninguém. Ficam no monastério Rongbuk uns dias pra aclimatar e vão para o avançado, a 6400. Junho não era uma época adequada, mas para conseguir escalar naquele ano antes do Uemura foi o jeito. Ele escala sozinho a parede do colo norte durante uma tempestade, acha tudo muito complicado e perigoso e decide que não está aclimatado.
Aí começa uma das partes mais legais do livro, eles saem a pé só os dois pelo Tibet, por um mês. Perambulam por tudo, passam embaixo do Xixapangama, no base do Cho Oyo, vivem com os nômades tibetanos. A violência da china fica clara com as destruições de tudo o que é cultural, mas os nômades, por não terem o que ser destruído, preservam o que sobrou e hoje está sendo usado para recuperar a herança cultural do Tibet.
Depois de muito andar, quase voltam a Kathmandu e finalmente o Messner acha que está aclimatado - consegue correr na altitude de 5400 sem subir o pulso - e que vai ter uma janela de tempo bom. Isso em 1980, com uma previsão de cientistas alemães do início do ano. Hoje, com previsões a cada hora pela internet, seria mais fácil.
A escalada começa com um acidente. Ele cai numa greta depois de duas horas acima do base avançado. Jura não continuar, mas consegue escalar os oito metros negativos (sem corda) e segue para o colo norte. Passa direto, vai até 7600 metros no primeiro dia, desde o avançado a 6400. Totalmente alpino, leva uma barraca minúscula de uma parede só e acampa.
No dia seguinte, segue se arrastando no meio de uma nevasca até 8300 e acampa numa saliência minúscula. As descrições da escalada são nítidas, detalhadas. O cara consegue filosofar a 8000 sem O2, pois não aceitou nem levar um rádio pra saber se o tempo tinha chace de melhorar. Ou seja, não tinha a menor idéia do que viria pela frente, mas ia pra cima sem parar, não sem indecisão, pois se o tempo fechasse de vez era o fim.
No terceiro dia ele escalou pela face norte e evitou a aresta nordeste, com os seus 3 escalões. Abriu um nova via, num terreno virgem. O Everest aquele ano estava branco, nem parece a imagem tradicional da face norte.
Escalar o Everest sem O2 - só ele e Peter Habeler haviam feito isso anteriomente, sozinho, sem preparação alguma da rota, numa via só escalada anteriormente 3 vezes, sem mais nenhuma alma na região, terminando numa nova variante, no outono. Impressionante. Chegou ao topo do mundo novamente e não teve vista nenhuma, tudo fechado.
A descida é outro capítulo, desceu de 8300 até o base avançado, caiu 150 metros rolando na parede que dá acesso ao colo e chegou semi-morto ao acampamento avançado. Levou uma semana para ter condições de descer até o campo base.
O título do livro vem dos horizontes em alta montanha, que contrastavam com os horizontes inexistentes do vale no Tyrol onde ele cresceu. Segundo o Messner, é o que mais o motivou na adolescência para escalar grandes montanhas - ver o horizonte acima do vale, libertar as aspirações. O Buzz Lightyear tem uma filosofia equivalente - Ao infinito, e além !!!
Leitura excelente.
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