Considerando que o objetivo da base aeróbia é permitir uma evolução de performance (leia-se, ir mais rápido e mais longe) e a da aclimatação também (ir mais rápido e mais alto), dá pra perceber o que há em comum.
Nos dois processos temos uma fase com objetivos parecidos. Na fase de base aeróbia normalmente treinamos por muito tempo em baixa intensidade, e na aclimatação passamos muito tempo em altitudes 'baixas'. O 'baixo', claro, é relativo e individual. Em termos de frequência cardíaca uns 138-142 bpm pra quem tem um limiar de 164. Em termos de altitude, muitas vezes pouco acima da metade da altitude do cume da montanha é onde se passa mais tempo aclimantando, com rápidas incursões a altitudes maiores. Ou seja, são baixos relativos ao máximo em questão.
Nessa fase o que fazemos é tentar modificar a nossa fisiologia para nos tornarmos mais eficientes. No consumo de oxigênio, na queima de gordura como fonte principal de energia, no aumento das mitocôndrias e dos glóbulos vermelhos. Mais eficientes para o que vem depois, que é correr no limite e ir o mais alto que podemos. Nos dois casos, ficamos mais saudáveis e fortes na base para poder aguentar o que vem depois e justamente, dar base ao que vem depois.
Pois acontece que a base aeróbia não vem sozinha. Quando a construímos também damos o tempo necessário para os outros sistemas se prepararem adequadamente ao esforço que virá. Por exemplo, o cardiovascular responde mais rápido que o muscular, que é mais rápido que a evolução dos ligamentos, tendões e cartilagens, que por sua vez evoluem mais rápido que os ossos no sentido de suportar a carga de treinos e provas. Idem para a aclimatação. Uma etapa acelerada ou mal feita certamente trará problemas mais acima, pois não haverá tempo dos demais sistemas terem se adaptado adequadamente à altidude.
Tanto no caso da base como no da aclimatação acontecem os platôs de desempenho, quando se não introduzirmos uma sobrecarga (treinos de alta intensidade e subidas a altitudes maiores, respectivamente), não há evolução, e portanto, não ficamos mais perto do objetivo. Ou seja, depois da base é preciso ter estímulos de alta intensidade e altitude, senão ficaremos presos 'lá embaixo'. Se o objetivo for apenas condicionamento ou ver a montanha mais de perto, excelente. Se for ir mais rápido e mais alto, é preciso introduzir intensidade.
O interessante disso tudo é que uma fase tida como 'chata' por alguns pode ser usada de uma forma totalmente diferente e divertida. Na base aeróbia é possível introduzir alguns treinos alternativos, mais descompromissados e onde podemos exercitar outras habilidades. Por exemplo, trilhas pra quem só corre em asfalto, MTB pra quem só pedala na estrada e vice versa, remo no lugar da natação. E na aclimatação podemos incluir escaladas menores, roteiros de trekking maiores, etc.
Portanto, o segredo para se construir uma boa base é achar uma razão para fazer a parte que poderia ser chata ficar divertida. O objetivo não fica sendo a coisa única, aproveita-se a jornada e não só a linha de chegada ou cume.
Um bom exemplo aconteceu esse ano. De uma forma ou de outra acabei fazendo treinos menos intensos nesse semestre, mas com um volume em zona aeróbia muito grande. Na preparação para o El Cruce e Indomit fiz longos de corrida bem longos, alguns em trilhas muito técnicas ou com grande desnível.
Além do prazer de transformar cada treino longo em uma aventura (afinal, levava celular, kit de primeiros socorros, lanterna e mochila), correr em trilhas naturalmente baixa a FC média e treina muita força. Isso acaba gerando uma reação em cadeia de melhor condicionamento cardiovascular e muscular que serve adivinha de que ? De base para o que vem em seguida. Estou certo de que é possível encaixar um período de alta intensidade curto e polimento e aproveitar isso numa maratona 'rápida' (novamente, relativo à distância). Assim espero na Maratona de SC no dia 17 de agosto :-). Claro, as trilhas ainda trazem junto os visuais incríveis, os amigos, as risadas e as roubadas, o que pode ser considerado um fim em si.
Além do prazer de transformar cada treino longo em uma aventura (afinal, levava celular, kit de primeiros socorros, lanterna e mochila), correr em trilhas naturalmente baixa a FC média e treina muita força. Isso acaba gerando uma reação em cadeia de melhor condicionamento cardiovascular e muscular que serve adivinha de que ? De base para o que vem em seguida. Estou certo de que é possível encaixar um período de alta intensidade curto e polimento e aproveitar isso numa maratona 'rápida' (novamente, relativo à distância). Assim espero na Maratona de SC no dia 17 de agosto :-). Claro, as trilhas ainda trazem junto os visuais incríveis, os amigos, as risadas e as roubadas, o que pode ser considerado um fim em si.
Em números, a FC média esse ano ficou em 130 contra 138 no ano passado. O volume em tempo acabou parecido, mas em ganho de altitude esse ano foi mais que o dobro. Uma variação dessas parece ser suficiente para deixar o basal mais baixo e a recuperação muito mais fácil. Praticamente me livrei de vez do incômodo no tendão de aquiles esquerdo de dezembro de 2013 pra cá, logo quando o volume de corrida deu uma disparada. Além disso parece que a eficiência também cresce muito. Tenho experimentado treinos de 16, 18 km no plano sem nada, água ou gel. Nenhum sinal de quebra também nas provas onde parece que a quantidade de carbo que tem que ser ingerida está menor.
Então, parece que fazer base dá certo. Ache uma coisa que seja divertida e obedeça a planilha quando ela mandar ir devagar.
Claro que ainda pode-se complicar tudo e procurar entender como o condicionamento aeróbio se sai na altitude, ou como a altitude afeta o desempenho esportivo. E o mais interessante de tudo isso, como treinar em altitude pode gerar um ganho expressivo de performance quando de volta a baixas altitudes, ou ainda, gerar mutantes que conseguem subir e descer o Mckinley em 11 horas ou o Mattherhorn em menos de 3. Mas acho isso vai precisar de um pouco mais de leitura, conversas com o André Cruz e algumas experimentação pra gerar outro post.
Trilhas, muitas trilhas ! Um lugar onde pace não existe... |