domingo, 24 de junho de 2012

Desafrio 2012 - a prova que redefine o que é correr ;-)

2010. Rampa logo após entrar no asfalto na subida.
Mais um Desafrio Urubici, já se vão sete anos correndo aquela prova pedreira. É um tipo de corrida totalmente diferente, ainda mais pra quem faz triathlon. Esqueça pace baixinho, tênis leve e material mínimo. Lá você vai com um tênis gordo, enche ele todo de água logo nos primeiros km e depois atola até os tornozelos na lama. Não, aquilo não é lama. É argila. E barro preto também tem, seguido de charcos alagados. Dá pra sentir o peso dos tênis nos pés. Terreno regular então ? Rampas de concreto, pirambeiras de argila com pedras soltas, rios cheios de pedras. Vai cheio de roupa (que se for pra tirar tem que carregar também), tem obrigatoriamente que carregar água, manta térmica, ataduras e toda a alimentação se for solo e sem apoio. Ou seja, aquilo lá redefine o que é corrida. E asseguro, é muito bom ! Diversão garantida.
O Hélio e eu na largada.
Cheguei na largada com o Hélio bem na hora que começou a verificação do material, achei a Taty e mais inúmeros amigos e fui pro carro me arrumar de vez, voltei trotando e entrei no lugar da largada. Saímos com 14 min de atraso em função da confusão pra botar o povo todo que chegou na última hora pra trás da linha.

Saí gelado e sem aquecer nada, fiz o primeiro km mais leve e soquei a bota. Sempre saio forte pra tentar evitar o engarrafamento na trilhinha fechada que começa no km 12. Até lá são uns 3 km de asfalto, depois estradas de terra, aí restos de estrada e rios bem cheios dessa vez, até o atoleiro que começa exatamente no km 12. Os tênis quase ficam lá. No ano passado uma pinguela de arame que ficava pouco antes deste ponto caiu no meio da prova e desta vez a organização fez um pequeno desvio, coisa de uns 100-200 mts, mas ficou muito bonito.

Neste caminho encontrei com um cara de Porto Alegre, o Clodoaldo. Seguimos conversando e ele perguntou qual minha categoria. Concluímos que éramos da mesma e seguimos em perseguição mútua. Não parecia ter muita gente à frente.

Quando a trilha acaba vem um sobe e desce de argila escorregadia até a cascata véu da noiva, que dessa vez só faltava a noiva debaixo. Muito volume dágua em função das últimas chuvas, bonita como eu nunca vi. Ao passar pelo posto de abastecimento logo ali só enchi uma garrafinha dágua e segui pra cima, agora no asfalto da estrada que vai até o topo do Morro da Igreja. Só então comecei a olhar pro garmin com mais atenção. Encaixei um ritmo legal e fui atacando as rampas, o que aqui significa andar inteligentemente quando a inclinação fica muito grande. Sobre o tempo todo mas tem uns platôs e descidinhas, então dá pra correr por boa parte da subida. Perto do topo dava pra ver os paredões da borda da Serra Geral com um mar de nuvens abaixo sob um sol forte e céu absurdamente azul. Um visual absurdamente bonito. Tocou no iPod When the Wild Wind Blows, do Iron Maiden. Mas não tinha vento. Desta vez corri com música, levei o iPod com uma seleção feita a dedo. Iron Maiden, AC/DC, Metallica e um pouco de U2 e Eagles. Coisa da boa. Antes pesquisei pra ver se era permitido. Muito bom.

Lá em cima tomei um monte de coca-cola e desci apressado, mas foi cruel começar a descer. A inclinação começa muito grande e eu não achava jeito de descer decentemente. Fui num ritmo mais ou menos pra não forçar demais, pois o bicho pega sempre na trilha de descida. Passei por alguém da Ironmind que não sei quem é, mas estava com a viseira. Identifique-se, please.

No posto de descida no véu da noiva pedi pro staff encher uma garrafinha, tomei dois copos de coca de uma vez só e quando fui beber um pouco da água era 'gatorade'. Tive que jogar fora e pedi um copo com água, o garoto me deu outro com gatorade que eu botei na garrafinha, taca fora de novo e finalmente abasteci dágua. O gatorade era visualmente igual à água.

Ali era o km 37 e voltávamos para a trilha, onde sobe um pouco para então entrar num plano inclinado muito bom de correr, pastos com caminho de jeep, pedras e rios. Ali é o lugar que eu sempre quebro, apesar de muito corrível e bonito. Só que dessa vez não sei o que houve. Eu não sei como corri ali, não lembro como fui parar no km 41. Na boa, foi muito estranho. Eu corria, ouvia uma música mas parecia tudo longe. Comecei a conversar sozinho. Pensei em olhar pro garmin, 'ah, dane-se o garmin'. 'Só corre. Ei, tu tá correndo, não quebrou. Quem é que tá correndo por mim ?'. 'Que música é essa, ah, High Way to Hell, AC/DC. Legal. Mas não tá um Hell, eu tô correndo tudo onde sempre me arrasto. Que placa é aquela ? É o km 41 ?!'. Sério, acho que sofri uma auto-abdução.

No km 42 começa uma descida que só termina no 44,5. Desce direto sem parar com uma inclinação dolorida, num barro claro cheio de pedregulhos. Sempre sofro absurdo ali e dessa vez não foi diferente. Descida miserável, aquilo lá é um verdadeiro moedor de pernas, ataca todas as partes ao mesmo tempo. Quando finalmente cheguei no plano comecei a correr até que bem mas foi dando uma sede descomunal, boca totalmente seca e garrafinhas também. No posto de água adiante tomei um copo e mais outro, aí enchei só uma garrafinha e toquei. Ali é o km 46 e só faltam mais sete - porque a prova tem 53 e não 52, a organização precisa consertar isso. Corri tudo até que bem e no último posto dágua apareceram dois atletas solo. Até então eu era ultrapassado por duplas o tempo todo, mas solo acho que foi só uns dois na trilha. Saímos do posto os três mas logo fiquei pra trás sem conseguir reação nenhuma.

Ao entrar na cidade uma súbita cólica abdominal me fez pensar no pior, teria que invadir uma casa e seria horrível. Mas tudo foi resolvido com a terceira parada para necessidades fisiológicas de baixa complexidade. Errei alguma coisa na hidratação dessa vez.

A reta de 3 km de asfalto parece ter 10, mas uma hora acaba. E acabou no pórtico de chegada com exatamente 5h27min08seg. Essa doeu. Forcei o possível o tempo todo e cheguei bem vazio, fazia tempo que não terminava tão oco. As panturrilhas morreram na subida, os quadríceps na descida do asfalto e o que sobrou na descida final e nos últimos km no plano. Correr essa competição faz aumentar ainda mais meu respeito e admiração pelos ultramaratonistas extremos. A BR-135, por exemplo, com 217 km e 6000 mts de desnível acumulado é algo pra tentar entender ainda ! Ah, aqui foram 1230 mts de subida !

Depois da prova, o processo para tentar voltar ao normal inclui comer e tomar banho. Aí voltei pra chegada e vi a Taty e o Hélio terminando, 3 integrantes da AndarIlha marcaram presença, só teve um edição que não teve ninguém da turma. Fui ver a classificação e adivinhem ? Fiquei em terceiro lugar na categoria. Sexta vez em sete participações que fico em terceiro. Tem que ter uma explicação pra isso. O segundo era um dos caras que me passou no último posto de hidratação e abriu 3 min, o Ricardo Dantas ! E o primeiro era o Clodoaldo de POA que fez 5h08, absurda a diferença que abriu, pois no topo eu estava 2 min atrás somente. Ponto pra eles. E pra mim, que ainda peguei pódio com 28 na categoria ;-). Mostra que o específico pra esta prova é pra aguentar a descida. Coisa que eu fiz 0 % nesta preparação para o Iron ;-). O resultado foi praticamente idêntico ao ano passado (1 min exato a menos), até a chegada em cima foi no mesmo tempo. Concluo que é o que é produzido em mim com um treino para Ironman: um Desafrio na casa de 5h25-5h30 4 semanas depois ;-).
Dãaaaaa vai largar !
O campeão foi o Biscoito (Cleber) da Tribo do Esporte. O segundo lugar foi o Gilberto também da Tribo e o terceiro o Daniel Meyer correndo de five-finger (!). Falando em Tribo, a Andréia Teixeira me deu uma mão. Ela é onipresente, tá em tudo que é lugar sempre incentivando. Aí depois da descida monstra lá estava ela. Eu tinha tirado a camiseta comprida e não tive dúvida, dei pra ela guardar. Um peso e estorvo a menos, hehehe, valeu.

Buenas, é isso aí. O relato ficou longo, mas são 53 km então tem que ser proporcional. Até a próxima.

5 comentários:

  1. Baita relato Pina. E baita prova, parabéns.
    Sobre o tamanho do post, para quem gosta do riscado quanto maior e mais detalhado melhor. :-)
    Abraço!

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  2. Ahe Rafael,
    Parabéns, realmente fazer o Ironman Brasil e o Desafrio logo depois é para poucos ! Tiro o chapéu, talvez se tivesse sem a carga do Iron tivesse vindo junto naqueles ultimos 3 km, parabéns novamente pela prova e pelo relato !
    Nos vemos nas trilhas, abraço

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  3. Beleza Milton, uma hora te arrisca lá que a prova é espetacular.

    Ricardo, a corrida foi dolorida mesmo, hehehe. Mas não viria junto naquele ritmo não... eu acho ;-).

    Abraço e até mais,

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  4. Legal xará, estou finalizando a preparação para minha primeira.

    To na dúvida até com que tênis correr agora..

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    1. valeu ! Tênis eu uso convencional. O trecho de trilha mesmo que exigiria um offroad é curto. O problema é barro argiloso, aquilo acho que até trator deslizaria...

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